segunda-feira, 15 de abril de 2019

terça-feira, 2 de abril de 2019

A Solução Final (aka Circo de Feras)

publicado em Política Virtual em Dezembro de 2001

I-A ameaça

“Quando o sangue de um inocente é derramado, é derramado o sangue da Humanidade. Do mesmo modo, quando uma vida é resgatada, é a vida de toda a Humanidade que é resgatada.”

Imã Mohammad Gemeaha


Passaram mais de 3 meses…parece que passaram anos, e no entanto… É a primeira vez que me atrevo a reunir as peças para falar sobre o assunto. Fiel à sua etiologia, terrorismo é a ciência de inspirar terror. Não só na televisão, no mundo dito “civilizado”, lá fora, mas no nosso mundo próprio interior. Uma vez estilhaçado, custará muito mais do que 100 “Justiças Infinitas/Liberdades Duradouras” a reconstruir. If ever.

Tanto foi já escrito, dito, mostrado por centenas de cadeias de televisão, como se mais depressa se apagasse o fogo por tanto falar dele. O que melhor retrata o non sense pós-traumático de uma geração que nunca esteve debaixo de uma guerra real foi precisamente a comparação com os filmes de Hollywood. O Apocalipse em Nova Iorque, revisitado, nunca tinha sido (publicamente) visionado de maneira tão incisiva e cruel. Sinais dos tempos, a arte não imita a vida, a vida imita as playstations.

É muito mais fácil carregar no botão e ver à distância arder 100 Hiroshimas. Mas o factor humano muda tudo…Pensávamos nós que nos conhecíamos melhor no terceiro milénio (dC). Pelo menos nestes últimos dois séculos o lema olímpico “mais depressa, mais alto, mais forte” pode com muita propriedade aplicar-se à nossa capacidade de aniquilação.

Hoje, sabendo o que sei, tendo visto o que vi, posso dizer que tenho medo, muito medo. Há 10 anos preparava-me para um mundo sem fronteiras, sem muros de Berlim, as ameaças votadas ao esquecimento. Hoje, tenho medo do ontem e do amanhã, porque realmente nem sei se um ou outro aconteceram ou virão a acontecer.

Por isso odeio religiosamente (e religiosamente tem um sentido diferente de fanático) quem quer que seja que tenha destruído esta ordem (exterior e interior). Porque a mim me roubaram o meu deus. O D grande ficou entalado nos escombros do WTC, cremado, partido, amortalhado, esquecido. Os que vão morrer Te saúdam.

A religião não me interessa, monstros há-os em todas, que delas se servem para os seus propósitos. Daí que, Ossama ou Adolf seja puramente indiferente, a Solução Final é a mesma, a impunidade perante si próprios coberta pelo mesmo manto hipócrita e ridículo, a sordidez e planeamento do embuste iguais.

Não a despropósito, Apocalipse quer dizer Revelação.


II- A cidade

A cidade, pela primeira vez na sua longa história, é destrutível. Uma simples formação de aviões do tamanho de um bando de gansos pode acabar rapidamente com esta ilha de fantasia, queimar as torres, transformar as passagens subterrâneas em câmaras letais, cremar milhões. A sugestão de mortalidade passou a fazer parte de Nova Iorque: no som dos jactos no céu, nos títulos a negro da última edição de um jornal."
Na mente de qualquer sonhador perverso (…) Nova Iorque deve manter um charme magnético e irresistível

  1. E.B.White, jornalista e escritor, conhecido dos americanos sobretudo pelas suas brilhantes histórias infantis, escreveu em 1948-49 “Here is New York”, pequeno livro sobre a sua cidade, não um guia turístico, mas uma visão e pressentimentos íntimos, dos quais escolhi dois acima transcritos.

    NY sempre teve consciência da sua magnanimidade, dos ghettos de negros e da esquina com a 5ª Avenida. NY é o mundo americano, palpitante, vivo, desembaraçado, só e plural. Manhattan é o nome de um filme de Woody Allen que nos faz lembrar Gershwin, a ponte de Brooklyn e as torres, à noite, um skylight a preto e branco de uma cidade hiper povoada que começou a crescer para cima.

    A 11 de Setembro dois aviões comerciais embateram contra as duas torres gémeas do World Trade Center. Estive lá, no Ground Zero, 109 andares acima, há 1 ano; vi as pessoas nos seus escritórios agriolhados por pequenas frestas metálicas em forma de janela; vi o céu lá em cima, Central Park lá ao fundo, a estátua da liberdade tão pequena lá em baixo.

    Foi megalomania construir as torres? Não creio que Deus ou Alá se pudessem sentir tão desafiados. Afinal demoraram mais de 20 anos a desenvolver a maneira mais eficaz, televisiva e que matasse o maior número de almas possível. E resultou.

    Para alguém da minha geração, pondo de parte o aspecto das perdas humanas, no espaço de um ano, assisti ao colapso de 2 instituições de alta tecnologia que nasceram comigo, ou o seu reconhecimento/sucesso foi meu contemporâneo: o Concorde e as Torres do WTC. Inabaláveis, diziam. Shaken, not stirred. Mares de chamas. Na era dos riscos calculados, o terceiro milénio brindou-nos com acidentes considerados inverosímeis mas que diminuíram a nossa fé no futuro radioso que sonhávamos viver. Cada dia que passa, a televisão, esse incrível aliado do infortúnio trata de nos desinformar um pouco mais e deprimir até à dependência absoluta das suas imagens irreais.

    Os nova-iorquinos fizeram o seu luto colectivo, acenderam as velas, cantaram os seus mortos, desfraldaram as bandeiras, enquanto o país procurava o seu presidente, temporariamente perdido no Air Force One; depois o presidente viu-se forçado a procurar um culpado (que não os organismos de segurança do estado, NSA, CIA, FBI) e um nome mais adequado que Justiça Infinita (pelos vistos, a inspiração no Corão soava demais a Al-Qaeda). Depois, foi o que foi e um dia será, o gato e o rato com algumas perdas colaterais pelo meio.

    O mundo recompõe-se, os analistas económicos respiram e é Natal. Mas este ano não há Menino Jesus e o Pai Natal encontra-se refugiado num bunker algures na Gronelândia.
    III- As vítimas

    Não sei se o mundo vai ser pior ou melhor. Mas vai ser diferente.”E. Athayde


    Desta vez não bastou ser filho de um deus maior, havia a promessa de um paraíso que só podia surtir efeito após uma lavagem cerebral. Em que pensariam os pilotos suicidas ao guinarem a bomba relógio de gasolina, velocidade, peso e reféns contra o alvo/gaiola? O que pensariam os passageiros desviados da sua rota ao verem dois prédio colossais cada vez mais perto? Há uma psicologia interna que nos escapa e que os últimos telefonemas não desvendam. Há um desespero surdo e surpreendido. Porquê eles? Porquê, sequer? Porquê terroristas culturais, especialistas em destruir o que restava do Afeganistão, se tornaram tão sedentos de sangue humano e espaço assegurado no prime-time?

    Porquê tanta ignorância acumulada em forma de ódio cego e demolidor. Porquê matar tanta gente inocente? Não há nada que se possa dizer que o justifique. Quem tentar é masoquista ou perdeu a razão. O que não é difícil.
    Nestes dias, razão e justiça são difíceis de encontrar.

    Not only do you need the courage of your convictions, sometimes you need the courage of your doubts.”

    Adlai Stevenson


Terre Haute Skylight (publicado em Política Virtual,, Julho 2001)


(11.6.2001, Indiana,USA)



"Eu sou o dono do meu destino


Eu sou o comandante da minha Alma"

William Henley

1992- discurso de tomada de posse, Nelson Mandela

2001- últimas palavras de Timothy McVeigh


Diz-se que durante o seu transporte para a cela da morte, McVeigh pediu para parar e olhar a lua e as estrelas. Diz-se que o seu último desejo foi um jantar de gelado de chocolate com hortelã-pimenta.

Diz-se que o diabo branco americano morreu, que a pena se cumpriu. Se se fez justiça ou não, cabe a cada cabeça, muitas achando demasiado brando o método que o recambiou para as chamas ardentes, algumas rezando pela sua pobre alma ("temos que lhe perdoar, só assim ficaremos livres").

A caridade cristã norte-americana patrocinou um circuito fechado de TV para as vítimas e familiares de vítimas do atentado de Oklahoma que não tiveram a suprema felicidade de ser sorteados juntamente com alguns jornalistas poderem assistir em directo, embora não in loco, aos 7 minutos e meio de uma morte há muito anunciada.

Diz-se que a vida imita a arte, a arte imita a vida; esta foi a Parte 1: "Dead Man Walking" de Tim Robbins, com Susan Sarandon e Sean Penn. Ainda se ouve Bruce Springsteen ao virar da esquina, quando os médicos e os guardas prisionais regressam a casa.

Descrição: McVeigh é amarrado a uma maca, seguem-se 3 injecções: 1ª, um sedativo, que prepara o organismo para não reagir, não haver aquela luta puramente animal, desenfreada e inconsciente, reflexo de sobrevivência que cai mal na CNN; 2ª, cloreto de pancurónio, derivado do curare, paralisa toda a musculatura esquelética, incluindo o diafragma daí resultando paragem respiratória (asfixia); 3ª, cloreto de potássio, provoca interferência na condução cardíaca, desregulando-a, levando à paragem.

Em 7 minutos e meio, paragem cardio-respiratória forçada. Não há reanimador na sala da morte, embora, em circunstâncias normais, qualquer doente nestas condições tivesse que ser imediatamente reanimado (no Juramento de Hipócrates, nunca diz para matar o próximo). Em circunstâncias normais, médicos especialistas teriam que esperar 48 horas para confirmar a morte cerebral, segundo apertados critérios.



"The Green Mile", baseado numa novela de Stephen King, leva-nos aos anos 30, tempo da "old sparky" (literalmente velha faísca), cadeira eléctrica cuja voltagem fazia apagar as luzes da vizinhança quando em utilização.
Timothy McVeigh desistiu por moto próprio da panóplia de recursos a tribunais, pedindo clemência. Decidiu não passar o resto da vida a esperar; assim, soube o tempo que lhe faltava viver.

Até o pedido do Papa caiu em saco roto aos pés do júnior e oligofrénico Bush. A Democracia baluarte dos valores do mundo moderno soçobrou à justiça olho por olho, dente por dente. Mostra bem a desagregação de um país onde os alunos do secundário praticam tiro ao alvo com os colegas e professores, tentando depois um harakiri estilo Pokemon. O país onde o anquilosado Charlton Heston clama por armas para todos. O país onde "pessoas normais", como o nosso vizinho da frente, perdem a cabeça e se tornam serial killers no McDonalds da esquina (será a BSE?).

O problema de McVeigh não era ter tendências de extrema direita, mas ser inteligente, ter formação militar (sendo até condecorado), e, sobretudo, ser um verdadeiro WASP. Nenhum americano lhe perdoa o facto de, com premeditação, ter agido como terrorista em próprio solo americano, destruindo um edifício federal como um castelo de cartas.

Se não fosse americano, era devolvido à precedência, e faziam-se umas manifs de vez em quando em frente à Casa Branca. Sendo americano, abriu uma ferida que não estanca no orgulho americano, no patriotismo sem limites e na paranoica caça às bruxas que inconscientemente defende os cidadãos americanos dos seus colonizadores europeus.

No filme "XFiles-Fight the Future", acharam a ideia de McVeigh tão boa que a recriaram em Dallas. Teoria da conspiração? O FBI nem sempre foi conhecido pelas suas virtudes, antes pelo seu poder velado.

Servindo uma vez mais de advogada do diabo (nunca pretendo pôr em causa a culpabilidade de McVeigh), o nosso terrorista é o típico introvertido e pacato cidadão com uma educação militar de códigos morais rígidos (quem mata quem em "American Beauty"?), que eventualmente chega a um ponto de colisão com o sistema, de não retorno ("Um dia de raiva", excelente desempenho de Michael Douglas), em que todos os mecanismos se dirigem para um objectivo concreto e a própria ideia de vida (própria e dos outros) se relativiza e secundariza até deixar de existir como tal. Segue apenas um comando, tal como a massificação da sociedade o moldou.

As reacções emocionais assoberbadas pelo aparentemente frio e contido nemésis americano na sua entrevista ao "60 minutes" não permite julgamentos livres de preconceitos. Pessoalmente, não descobri uma mente intuitivamente criminosa, um pavão preconceituado neo-nazi como o pintaram. Perpetrou um acto terrorista contra a Mãe de todas as instituições, o estado americano, tendo morrido muitas pessoas inocentes. Não se esquivou à responsabilidade. Estava preparado para o crime e o castigo, como um soldado na frente de uma batalha.

E assim perante o Deus que é citado nas notas de dólar, e George W Bush, o tal senhor que parece que é presidente dos EUA mas não tem bem a certeza, Timothy McVeigh olhou para a câmara de televisão estrategicamente colocada no tecto, olhos fixos do efeito do sedativo…

…Aquele que já morreu vos saúda.


Auto da Barca do Inferno (publicado em Política Virtual, Setembro 2000)



Mote:
"um povo de escravos e de reis construiu uma civilização sumptuosa e esmagadora, onde, a cada passo, os vivos são convocados ao mundo subterrâneo dos mortos"
Miguel Sousa Tavares
Quatro graus centígrados à sombra, a fugir de cadáveres tornados fantasmas, cianosados e lívidos. O seu próprio reflexo na água que o rodeava. Percebeu que não conseguiria fugir. Estava demasiado frio, demasiado escuro, demasiado peso a latejar na sua cabeça.

Automaticamente martelou na escotilha SOS durante mais de uma hora. Doía-lhe o corpo todo, não só do embate que as explosões tinham provocado em toda a embarcação e que o tinham projectado uns bons metros a uma imensa velocidade contra algumas estruturas metálicas bastante duras, como também da brutal velocidade do afundamento, que lhe causara vómitos incontroláveis, à medida que via os corpos dos seu companheiros serem levados pelas águas.

Doía-lhe o corpo de uma hora de esforço quase em apneia. Tossia e sentia os pulmões saírem-lhe pela boca. Era inútil continuar, ninguém o ouviria. Quando alguém os descobrisse estariam todos mortos…Já não faltaria muito. Era inútil tentar aquecer-se fazendo qualquer tipo de exercício, porque ficaria ofegante e tonto pela falta de oxigénio. Tinha encontrado um local onde se refugiar, ironicamente perto da escotilha que não lhe permitia a salvação. O nível da água tinha parado de subir. Era uma questão de tempo. Um marinheiro nunca abandona o seu posto. A morte também tem o seu código de honra.

O seu espírito semi-adormecido pensou nas mães, mulheres, irmãs, que tinham feito e oferecido literalmente tudo aos senhores almirantes, e a todos os que mandavam nalguma coisa, para que os seus meninos não fossem fogo fácil na Tchechénia. Afinal tinham-se trancado num mausoléu nuclear pior que o Titanic. Que o diabo as leve, que o diabo os leve a todos os camaradas lá de cima.

- É pá, chamaste? Desculpa estava a tirar uma sesta.

- Mas quem és tu, julgava que já estivesse sozinho neste caixão.

- Então não chamaste? Eu sou o diabo, ao teu dispor.

- O diabo, o mafarrico em pessoa? Olha que não pareces. Se és o demónio, o que aqui estás a fazer? Tens um ar muito normal. Isto são alucinações. Não tens por acaso nenhuma ideia para nos fazer sair daqui?

- O diabo nunca brinca. Vocês é que me trouxeram, vocês é que me libertaram. Digo-te que dentro do reactor se estava muito melhor…Mas não me queixo, a água e a pressão atmosférica não me afectam. Posso até aquecer-te, se quiseres. Aliás, tenho uma proposta a fazer-te, não queres trabalhar para mim?

- Já trabalho para ti lá em cima, que queres mais? As minhas mãos estão a ficar roxas.

- Fazia-te bem, um bocadinho de calor …humano. Eu aqueço-te, transformo-te em oficial da ponte de comando, tu és salvo, dizes aquilo que te ensinaram, fica o nosso pequeno segredo bem guardado, ninguém resgata o submarino, eu volto descansado para o reactor, tu tornas-te herói, rapaz.

- Qual segredo bem guardado, não sei sequer o que se passou, onde estamos nem a que profundidade, não sei o que aconteceu aos outros…

- Melhor ainda então! O que me dizes, rapaz, aceitas?

- E as contrapartidas, Camarada Putin, não me leva a alma ou coisa assim ?

- Não gosto que me tratem por esse nome. Rapaz, a alma já ma vendeste há muito tempo. Só precisas contar a história do submarino americano que nos abalroou. E lembra-te que não temos ogivas nucleares.

- E quando é que me vêm buscar?

- Assim que tu aceitares a minha proposta, acredita.

- E o que é que acontece quando voltar para o reactor?

- Não estás a querer saber demais? Olha que não estás em posição para regateios… Já não há oportunidades para nós, diabos, lá em cima, enquanto que aqui…enfim, temos outras armas…mais sofisticadas. Não revires os olhos agora, preciso de uma testemunha a toda a prova, acorda.


O corpo do marinheiro entrou em convulsões enquanto o fio do pensamento se dissolvia na água gelada.

Quando os mergulhadores noruegueses abriram a escotilha encontraram o seu corpo já mumificado pela água do mar. Uma das mãos estava cerrada como se agarrasse qualquer coisa com muita força. Quando a abriram, descobriram um punhado de cinzas.



segunda-feira, 1 de abril de 2019

Jamie Cullum (publicado em Repórter Sombra a 13/2- última colaboração)


O rapaz tem ritmo e é homem dos sete instrumentos. Pode não parecer, mas é muito rodado (em instrumentos, bandas e cultura musical). Como diria um certa canção, “nasceu para a música”.
Jamie Cullum nasceu a 20 de agosto de 1979 em Rochford (Essex), a 70 km de Londres, mas foi criado em Chippenham (Wiltshire), no sudoeste de Inglaterra. O seu pai nasceu em Jerusalém (tendo a família fugido da Alemanha nazi) e a sua mãe na Birmânia (actualmente Myanmar), filha de pai indiano e mãe birmanesa.
Tem um irmão mais velho que também é músico, e é casado com uma neta do grande Roald Dahl (escritor de Charlie e a Fábrica de Chocolates, Matilda, O Fantástico Sr Raposo...).
Completou na Universidade de Reading a licenciatura sobre Literatura Inglesa e Estudos Cinematográficos.

A primeira vez que ouvi Jamie Cullum, foi em Everlasting Love, uma canção com pelo menos uma dúzia de covers, e gostei do estilo jazzy e retro, mas muito fluído e moderno. A parti daí comecei a descobri-lo para trás e em frente em simultâneo.
Everlasting Love faz parte da banda sonora de O Diário de Bridget Jones, mas na discografia de Cullum pertencia a Twentysomething, não o seu primeiro trabalho, mas com o qual começaria a ter o devido reconhecimento como cantor e autor.
Cullum não teve educação formal em música, mas pôs as mãos em diversos instrumentos cedo, na sua infância e adolescência. Começou pela guitarra, foi baterista em bandas rock e finalmente chegou à conclusão que teria que se atirar ao teclado (do piano). Aprendeu a tocar “de ouvido” e até hoje não sabe ler música.
Em vez do pouco confortável banco utilizado exclusivamente para tocar piano, costuma utilizar o banco com que tocava bateria (visível nalgumas fotografias, com padrão tigrado). Tem também uma caixa de madeira que amplifica a batida do seu pé (stomp box).

Cullum produziu o seu primeiro álbum, Heard It All Before, com 480 libras, em 1999. Dele constavam vários clássicos do Great American Songbook. É hoje considerado um raridade.
Após a licenciatura, lançou Pointless Nostalgic (2002), com uma mistura de originais e covers de clássicos com novos arranjos. Destaco “It Ain't Necessarily So” (Gershwin), com um componente de percussão/contrabaixo geniais, e “High and Dry”, no contemporâneo/fusão.
Em 2003 chega Twentysomething, que inclui standards, covers de clássicos dos quais destaco ”I could Have danced All Night” (My Fair Lady) pela percussão e génio da guitarra electrica com um pingo de hip-hop, “The Wind Cries Mary” (Jimi Hendrix)e o original dos irmãos Cullum “All At Sea”.
Já considerado o melhor intérprete de jazz britânico, lança Catching Tales (2005), álbum de originais e de colaborações, com Dan the Automator e Pharrell Williams. Destaco “Get your Way”, na vertente hip-hop e “Photograph”, num registo mais intimista.
The Pursuit (2009) é infamemente conhecido pelas aparentes explosões de pianos de cauda na promoção. Mas não vive só da infâmia: excelente cover de “Don't Stop the Music” (Rhianna) e que dizer de “Gran Torino” (música de Clint Eastwood, do filme homónimo)...
Em 2010 pássa a ter o seu próprio programa de rádio semanal na BBC2.
Sobre Momentum (2013), Jamie Cullum diz ser acerca do período onde se tem um pé nas fantasias de infância e outro no mundo de responsabilidades dos adultos. Destaca-se a cover ”Pure Imagination” e os originais “Everything you didn't” do e “You're not the only one”.
Interlude (2014) é um álbum de covers de luxo, com colaborações de Laura Mvula e Gregory Porter.
The Song Society Playlist foi lançada no final de 2018, em formato digital. Os seguidores (como eu), do canal YouTube de Cullum têm visto e ouvido algumas canções nos últimos anos, que seguem as seguintes regras: 1) escolhe uma canção que adores ou pela qual estejas fascinado; 2) aprende-a e grava-a numa hora; 3) não é permitida preparação prévia; 4) ama e vive(aprende) com os erros.
Eis o link, as canções falam mais que mil textos:



Army of me (publicado em Repórter Sombra a 29/1)

A palavra pessoa deriva do latim persona, que quer dizer máscara. Contudo, não uma máscara qualquer; prosopon, a raiz grega, refería-se à máscara ou face utilizada pelos actores no palco para revelar ao público a personagem e seu estado emocional.
Não deixa de ser irónica esta dualidade que chegou à era moderna, sobre o sentido do eu como indivíduo e, ao mesmo tempo, como a sua própria máscara, para os outros.
A personalidade será então a nossa máscara muito própria, um conjunto de características psicológicas (pessoais e intransmissíveis), que através de padrões cognitivos, emocionais e de comportamento, determinam a individualidade pessoal e social de alguém.
Traduz portanto um grande conjunto de processos organizados do nosso pensamento, com características consistentes e estáveis ao longo do tempo e, apesar de assentar em conceitos psicológicos, encontra-se intimamente ligada com o nosso restante organismo (como unidade biológica).
Se pensarmos  em neurónios, sinapses, neurotransmissores (moléculas que modelam a transmissão de sinais nervosos) e em toda a estrutura biológica implicada nas bases do funcionamento cerebral, parecer-nos-ia fácil aceitar uma programação genética como base para vários processos mentais.
A verdade é que, do ponto de vista científico, até hoje, apenas se conseguiu provar uma relação genética directa com algumas doenças degenerativas e com graves perturbações do funcionamento cerebral.
E apesar de se terem empiricamente definido alguns “traços” de personalidade (“temperamentos”) que podem estar associados a diferentes expressões de neurotransmissores (extraversão, amabilidade, responsabilidade, estabilidade emocional e abertura a novas experiências), certo é que não há ligação genética que preveja esses traços.
Por outro lado, surge a teoria epigenética -  não há “nature” sem “nurture”, ou seja é o próprio ambiente que vai ser determinante para a expressão genética (leia-se o ambiente celular, o ambiente no organismo, e em última medida, o ambiente externo que os condiciona).
 Sabe-se também que, apenas para determinar a quantidade de um neurotransmissor, é necessária a expressão conjunta de vários genes, sendo a relação causa-efeito muito mais difícil de prever.
Concluímos então que o ambiente é fundamental para estruturar a nossa personalidade.
Pensemos no ser humano, um animal social e com grande avidez de conhecimento. Na infância, a sua casa (o seu lar), a sua família (mãe, pai, irmãos), os afectos, vão ser determinantes. As tradições e histórias que a família passa de geração em geração. Os valores culturais e morais que prezam. Os seus credos e leis.
As crianças tendem a mimetizar o comportamento dos adultos à sua volta. A criar o mesmo tipo de relações sociais. Nestes últimos anos, a fase pré escolar e escolar já é sobreposta a uma outra fase, a da relação com elementos não humanos que produzem entretenimento ou informação (tablets, computadores, etc). De que modo influenciará as gerações futuras?
O ambiente da escola, a socialização, os amigos e os tempos livres. O lugar onde vivemos e as coisas com que aprendemos a sonhar. A nossa personalidade abarca tudo isso.
Na idade adulta, o trabalho, a sociedade (e como apêndice, as redes sociais) influenciam o nosso conceito de normalidade ou de padrão desviante, o sentimento de pertença a grupos ou clubes, a liberdade ou a pressão de pensar (ou não )no futuro. E escolher que “máscara” representar para os outros.
A minha máscara, o exército de mim, é um exército de todos.

Pipocas e distorção da realidade/personalidade:
Army of me (1995)/Bjork (Sucker Punch, 2011)

Um mundo infestado de demónios (publicado em Repórter Sombra a 14/1)


Há algum tempo, decidi abordar o tema da vacinação e seus detractores, os surtos anuais de doenças infecciosas da infância que se pensavam quase erradicadas, as consequências para a saúde pública de uma diminuição na imunidade de grupo, e a interferência no processo de decisão de algo tão importante como o plano nacional de vacinação, de tantos elementos “estranhos” ao processo.
Na verdade, se uma pesquisa na internet por “vacinação” em português é relativamente clara, mal passamos para o inglês, vemos uma web que defende na sua maioria a não vacinação, atacando todos os pontos possíveis (e sobretudo imaginários) das vacinas individualmente ou no seu conjunto.
A capacidade de clarificar ou debater os argumentos dos movimentos anti-vacinas relembra-nos que estamos numa era de negacionismo, onde parece haver mais valor na negação de conceitos estabelecidos (seja a democracia, a ciência ou a tolerância relativa a pontos de vista diferentes dos nossos), e na admissão dogmática de novas “verdades” intuídas por uma nova cultura de pseudo-informação em massa.
Relembro um meme que encontrei, algo por acaso: “Laboratório de Pesquisa de vacinas / 200 anos de pesquisa e desenvolvimento; Laboratório de Pesquisa anti-vacinas / 200 minutos de intensa navegação na internet”.

Para mim a descoberta da vacinação e de como o nosso sistema imunitário adquire uma memória imunológica sobre os agentes infecciosos com que entrou em contacto são dos passos mais importantes que a ciência da nossa pequena civilização já deu.
O nosso sistema imunitário (possivelmente um dos mais complexos do organismo) possui células de memória (linfócitos T e B). Havendo um segundo contacto com um agente infeccioso já
“conhecido” anteriormente pelos linfócitos, estes desencadeiam uma resposta muito mais rápida, eficaz e dirigida.
  Ao “apresentarmos” os agentes aos linfócitos sem provocar a doença (vacinação), obtemos imunidade contra várias doenças infecciosas com elevadas taxas de mortalidade e morbilidade, tanto na infância como na idade adulta (onde a sintomatologia é quase sempre mais grave).

A variolação, utilizada desde o século X na China e Índia, consistia na inalação ou inoculação com lanceta afiada, de material purulento de doentes infectados com varíola. Os indivíduos inoculados tinham uma forma leve da doença, embora houvesse uma mortalidade de 3%.
E como era essa doença, a varíola? Caracterizava-se por surtos epidémicos, sendo muito contagiosa, causando febre, dores musculares, vómitos e um rash cutâneo que progredia rapidamente para vesículas, pápulas e pseudo-pústulas (borbulhas com conteúdo opaco visível, parecido com pus) por todo o corpo, evoluindo para tecido de cicatrização desfigurante.
A mortalidade era de cerca de 30% (superior em crianças com menos de 1 ano) e nos sobreviventes era a principal causa de cegueira. No século dezoito a mortalidade anual na Europa chegou a ser de meio milhão de pessoas. Os efeitos secundários da variolação pareciam portanto suportar a relação risco-benefício.
O conhecimento e prática da variolação espalhou-se ao Império Otomano e ao Norte de África, acabando por no início do século dezoito já ser prática comum nas elites europeias e nas colónias americanas. E com a prática, vieram as primeiras controvérsias, sobretudo de carácter religioso, sendo a variolação considerada uma operação satânica e diabólica: “As doenças são enviadas, senão para Teste da nossa Fé, para o Castigo dos nossos Pecados”.
Após observação de que as leiteiras quase nunca contraiam varíola, o médico inglês Edward Jenner (inoculado em pequeno), concluiu que a sua imunidade à doença deveria ser consequência da sua exposição às pústulas nos úberes de animais infectados com cowpox (varíola bovina, também designada vaccinia). Em 1796, Jenner inoculou um rapaz de oito anos com material recolhido de bolhas das mãos de uma leiteira; após febre ligeira, recuperou e Jenner inoculou-o com varíola. O rapaz não sofreu os sintomas associados à variolação.
Esta nova técnica, chamada vacinação, provou ser mais segura e eficaz que as anteriores estratégias de inoculação, e em poucos anos foi reconhecida pela comunidade cientifica e pelos governos da Europa e Estados Unidos da América. As objecções continuavam a ser de ordem religiosa (a vacinação interfere com os planos de Deus e espalha dúvidas sobre a sua omnipotência) e de bestialidade (inocular em humanos “humores” animais).
No século XIX, as melhorias no saneamento básico e os esforços políticos para tornar a vacinação obrigatória, por vezes de maneira coerciva, levaram a grandes protestos anti-vacinação, argumentando que era não só um veneno, mas uma ameaça à liberdade individual, e que da competência dos governos seria providenciar “ar puro, água límpida e alojamentos decentes”.
Nos finais do século XIX e no século XX, compreendendo já a causa (agente infeccioso) de muitas epidemias, criaram-se várias novas vacinas, com bactérias ou vírus vivos ou inactivados, mortos, toxinas, ou apenas as suas porções mais imunogénicas (que conferem mais imunidade), e várias doenças infecciosas foram controladas com sucesso. Para além disso, as vacinas foram-se tornando mais eficazes (imunogénicas) e seguras (com menos efeitos secundários).
A varíola foi a primeira (e única até à data) doença infecciosa humana totalmente erradicada a nível mundial em 1980.
Actualmente 13 doenças são prevenidas através do Plano Nacional de Vacinação, uma iniciativa da Direcção Geral de Saúde, que em Portugal teve o seu início em 1965.
A vacinação planeada a nível mundial contribuiu para salvar milhões de vidas, calculando-se que apenas nos Estados Unidos tenha prevenido 100 milhões de casos de poliomielite, sarampo, rubéola, papeira, hepatite A, difteria e tosse convulsa desde 1924.
A vacinação providencia também uma forma de protecção indirecta – Imunidade de grupo – quanto maior a proporção de indivíduos numa comunidade se encontrarem imunizados, menor a probabilidade dos que não estão imunizados entrarem em contacto com um individuo infeccioso.
Ora isto torna a vacinação não só uma opção individual, ou melhor uma opção que altera o futuro da vida dos nossos filhos, mas também da saúde da comunidade. Os indivíduos não imunizados podem não ter escolhido não ser vacinados. Podem estar a fazer quimioterapia ou terapêuticas que suprimam a imunidade, ou ainda terem formas primárias ou secundárias de falência imunitária.
Por outro lado, em locais onde predomina a opção de não vacinar aparecem surtos que podem afectar comunidades inteiras com baixa imunidade de grupo, e alastrar a zonas bem diferentes do país ou do globo, dada a fácil mobilidade actual.

Partimos do princípio – eu partia do principio – que o que acabei de rever até aqui são conceitos básicos que qualquer adulto deveria ter em mente ao tomar uma decisão ponderada. Acontece que os adultos de hoje não conhecem as doenças porque não as tiveram e só valorizam os aspectos negativos que saltitam na web todos os dias.
Eu nasci nos anos 70 e cumpri o PNV à época. E fui mais a excepção que a regra. Após a primeira inoculação da vacina da varíola desenvolvi um quadro meningiforme, que foi tratado prontamente e interpretado como alergia cruzada com a proteína do ovo (estava na fase da diversificação alimentar e tinha intolerância ao ovo).
Não fiz a vacina do sarampo (ainda não havia VASPR, sarampo-papeira-rubéola), que também era cultivada em embriões de galinha. A pediatra pensou, eh, tem muito tempo para apanhar sarampo em miúda. Acontece que não apanhei, e em boa verdade, até hoje não vi frente a mim nenhum doente com sarampo. Das célebres doenças da infância só conheci a papeira (muito chata, mas passageira) e mais tarde uma varicela “light”.
Antes de entrar para a faculdade levei finalmente a vacina do sarampo. Por essa altura começaram a aparecer surtos episódicos de sarampo.
Posso afirmar que tive pouca experiência com estas doenças tradicionais, mas isso nunca me impediria de vacinar os meus filhos. Não me cabe a mim por o futuro deles em risco, nem o de pessoas dentro da comunidade que podem não ter imunidade por outras causas que não a negação de um procedimento simples e seguro.
Não se pode pedir a indivíduos e crianças saudáveis que se submetam a injecções profilacticas que alterem o seu estado de saúde. E repito, os casos de efeitos secundários graves são mesmo muito raros.
Não vou responder a listas sem fim de acusações a vacinas, mas custa-me perceber como um estudo fraudulento com vinte anos (1998), condenado por todos os pares, sugere uma ligação entre a VASPR e o autismo perfeitamente irreflectida e irresponsável tenha alcançado o nirvana da net  e sido acolhido pela comunidade anti-vacinas como um maná. Uma manequim americana com um filho autista percorreu o caminho do programa da Oprah Winfrey e do Dr Oz, e alimentou o mito.
A realidade é tão mais simples. O autismo tornou-se agora um grupo largo de doenças, não tem ainda causa provada, mas é muito mais diagnosticado. Não há relação, nem com excipientes, nem com a vacina.
Há também defensores do equilíbrio com a natureza que acham que o plano de vacinação é um “shot” imunitário que vai desequilibrar as crianças. Bem, nestes últimos 30 anos isso não aconteceu.
E faltam ainda os fanáticos da conspiração: o conluio (“collusion”, que interessante) entre a Big Pharma, o governo e os médicos. Curiosamente, nos EUA, tenta-se empurrar para baixo da mesa um real conluio da Big Pharma, que favorece a utilização de analgésicos opioides em dores crónicas, que leva milhares de americanos a tornarem-se toxicodependentes. Para estes, não parece haver teoria da conspiração. Nem para a National Rifle Association...

O que pode ter mudado, para as pessoas mudarem tanto? Por um lado, a palavra de um médico já não tem o peso da experiência e do conhecimento; é apenas mais um prestador de serviços. O acesso à informação sem crítica e sem filtro não conduz à democratização do conhecimento, mas sim à nivelação pelo que tem mais visualizações (habitualmente o mais controverso e irrefletido).
Falta-nos também civilidade, cultura e cidadania, e sobra-nos em egoísmo. Os pais não querem ter trabalho com filhos doentes e acham que as vacinas os podem por doentes, porque essencialmente são incultos em história recente, em relacionamentos humanos, e já agora, nalguns princípios básicos de saúde pública.
A vacinação é um bocadinho de saúde que (ainda) é oferecida a todos. Aproveitem enquanto existe.

Relatório do Interior (publicado no Repórter Sombra a 7/01)


“ No início, tudo estava vivo. Os mais pequenos objectos eram dotados de corações pulsantes, e até as nuvens tinham nomes.” Paul Auster, Relatório do Interior

Nestes tempos modernos, vários factores contribuem para o nosso desequilíbrio físico e psicológico. Falo aqui de desequilíbrio não como doença, mas como desgaste, inquietude ou alteração do estado normal.
Uma vez que a sociedade se encontra virada para a produção, o lucro, o imediatismo e a obsolescência programada, não é fácil resistir ao sentimento de que, como grãos de areia que  somos, nos encontramos particularmente susceptíveis a ser esmagados pela velocidade, pela força, pelo passado e pelo futuro.
Os tempos livres que nos restam são passados online, a consumir todo o tipo de produtos e bens materiais ou coexistir em redes sociais falíveis, que vivem da conquista da aparência e do fictício.
No meio de tudo isto, temos de nos gerir a nós mesmos. E não se pense que os variadíssimos métodos que existem são recentes. Por vezes tornam-se “moda”, a new age dos anos 90, a mindfulness dos últimos anos, mas não são mais do que nomes diferentes para a mesma ideia base.
Desde o surgimento das grandes religiões, começando pelo oriente, e aliadas a sistemas de pensamento, o hinduísmo, o taoísmo e o budismo acabaram por sugerir métodos de concentração e de auto-conhecimento, levando os praticantes mais perto  da verdadeira consciência, plenitude, realização e felicidade.
Com facilidade nos surgirá no pensamento a imagem de alguém na posição de flor de lótus, o que não é descabido, embora não seja obrigatório. O ioga (em sânscrito yoga, significando controlar, unir, concentrar) é utilizado hoje em dia não apenas por crentes,e em contexto religioso, mas por pessoas por todo o mundo, para relaxar e meditar.
Por outro lado, até as religiões judaico cristãs utilizam há muitos séculos a oração, o silêncio e a contemplação como veículos de fé, mas também de conhecimento do próprio.
Finalmente, no século XX, como corrente de pensamento da psicanálise, Freud (re)desenvolve os conceitos de consciente/inconsciente: na nossa mente o “ego”, ou “eu”, é o fruto do combate entre o “superego” (regras e condicionalismos sociais aprendidos) e o “infra-ego” ou “id” (cujas pulsões seguem o princípio do prazer).

Mantendo uma maior simplicidade, para meditar é apenas necessário sentar-se e relaxar, sendo uma boa maneira de fazer uma pausa, desligar dos problemas externos e fazer uma espécie de sincronização entre nós próprios e o momento em que nos encontramos. É a altura em que descobrimos o nosso carpe diem e deitamos para trás das costas o control-freak que há em nós.
É, pelo menos, a sensação que tive, nas oportunidades em que tive de meditar em conjunto. Fixamo-nos apenas na respiração, ouvimos e seguimos uma voz suave, por vezes acompanhada por música, e vamos até onde a mente nos levar. E é importante pensarmos que nos sentimos relaxados, não apenas física, mas também psicologicamente, tendo abdicado, por algum tempo, de tudo aquilo de que é feito o nosso dia a dia: pressa/pressão, controlo/descontrolo, organização/desorganização.
Não precisamos de controlar o futuro que não conhecemos, o presente que não dominamos, o passado que já aconteceu. Precisamos apenas de ser nós, e de nos descobrirmos nesse processo.


Pequeno jardim zen para relaxar: